Multimídia sem mídia

Um pouco depois disso, por volta de 1995, a gente descobriu a web. Eu me lembro do meu amigo Galdino explicando essa nova tecnologia que ele estava preparando para liberar para os alunos. Era uma forma de acessar a internet em “multimídia” através de hipertexto. Em outras palavras, não era mais só texto: dava para acessar imagens, sons e vídeos, e tudo isso ligado por links. Um link era simplesmente uma ligação entre dois arquivos ou duas informações, permitindo navegar de um ponto a outro. Hoje isso parece óbvio, mas na época era revolucionário. A ideia de sair de um documento e cair em outro completamente diferente, instantaneamente, era novidade.

Alguns dias depois, o trabalho do Galdino ficou pronto e finalmente pudemos usar um navegador. O primeiro browser que vimos foi o Mosaic, mas logo depois apareceu o Netscape Navigator, e aí sim alguns descobriram o “cheat code” que fazia surgir o Godzillazinho — o famoso mascote Mozilla, como era chamado na época e que acabou virando o nome da fundação que hoje faz o browser Firefox. Também liberaram um servidor web com páginas do Departamento de Computação. Os usuários podiam criar um diretório próprio e hospedar suas páginas pessoais. Bastava escrever alguns arquivos HTML para publicar conteúdo para o resto da internet. Foi uma mudança radical. Muitos alunos começaram a experimentar e criaram suas páginas, que nem sempre tinham muita utilidade, mas eram ótimas para aprender a lidar com aquela nova tecnologia. E foi nessa época que surgiu um dos maiores crimes estéticos da história da web: a tag <blink> , que fazia o texto piscar na tela. Quase todo mundo usou, sem a menor noção de design. Com tanta gente usando, o link da universidade não dava conta da demanda. A web podia até ser multimídia, mas a gente usava só texto, porque as imagens levavam muitos minutos para carregar e ninguém tinha paciência. O que quero dizer é que a gente desativava o download das imagens das páginas para elas carregarem mais rápido. Se fosse pra esperar carregar as imagens, podia deixar baixando e ir tomar um café.

Nessa época a gente tinha um time de futebol para jogar o campeonato do departamento, a gloriosa esquadra bolínea d’Os Pereba. E, sendo alunos de computação, é claro que criamos o site do time. Tinha de tudo: hino, fotos, lista de jogos, escalações e até uma animação de um jogador do time errando a bola que meu irmão programou em JavaScript. Era um site super informativo, se é que alguém realmente precisava de tanta informação sobre o time. É bom lembrar que, naquele período, a informação ainda circulava por revistas e jornais. Mesmo com a internet nascendo e algumas páginas aparecendo na web, ainda eram as revistas que apresentavam ao público os sites “interessantes” que existiam na internet brasileira. Não havia buscadores de verdade, apenas listas manuais de links. Para nossa surpresa, o site dos Pereba foi listado na revista Internet Word. Era uma nota sobre sites de esportes e, na seção de futebol, lá estávamos nós ao lado do Fluminense e outros times profissionais. Foram nossos quinze minutos de fama.

Outra novidade daquele período foi o lançamento da linguagem Java. Lembro bem do marketing em cima da ideia de write once, run anywhere, a promessa de rodar o mesmo código em qualquer plataforma. Isso gerou discussões intermináveis entre os alunos. Quando fiquei sabendo que ia haver um evento de lançamento do Java no Rio de Janeiro, comprei a passagem, fiquei hospedado na casa do meu tio e fui conferir. O evento era bonito, bem produzido, cheio de expectativa e promessas. Do ponto de vista técnico não tinha muita coisa, mas para quem estava estudando computação era empolgante ver aquelas ideias surgindo, mesmo que muitas delas nunca tenham sido realmente cumpridas, mesmo décadas depois.

Uma etapa importante da minha formação foi quando comecei a fazer iniciação científica na universidade. Mas essa história fica para a próxima conversa.